Pular para o conteúdo principal

Sobre criaturas e criadores


Me impressiona como toda discussão aqui no Brasil termina numa discussão teológica: o mal versus o bem. Com a questão da maioridade penal não seria diferente.  Claro, o Brasil é tão errado que fazer algum esforço para fazer alguma coisa boa, mas não escandalosamente boa,  é "errado".  Esse é o apelo ao pior problema...

A jornalista Eliane Brum é uma dessas pessoas que "acredita" nisso. O texto na íntegra encontra-se aqui. Comentarei trechos de sua parte inicial. Vejamos:

Eu acredito na indignação. É dela e do espanto que vêm a vontade de construir um mundo que faça mais sentido, um em que se possa viver sem matar ou morrer. Por isso, diante de um assassinato consumado em São Paulo por um adolescente a três dias de completar 18 anos, minha proposta é de nos indignarmos bastante.  Não para aumentar o rigor da lei para adolescentes, mas para aumentar nosso rigor ao exigir que a lei seja cumprida pelos governantes que querem aumentar o rigor da lei. 

Uma coisa não exclui a outra, cara Eliane. Aumentar o rigor da lei para adolescentes e  exigir que a lei seja cumprida pelos governantes não são coisas mutuamente excludentes.

(...) Se eu acreditasse por um segundo que aumentar os anos de internação ou reduzir a maioridade penal diminuiria a violência, estaria fazendo campanha neste momento. (...)
O que me leva a especular: será que autora acredita no contrário disso!?  No extremo, o tempo de reclusão ("internação") seriam dias, talvez horas (tanto para adolescente quanto para adultos). Será que isso não afetaria a violência, por excesso de leniência do estado!? Será que a reclusão por tempo mínimo de indivíduos perigosos não comprometeria a segurança pública? Ok. Ruim. Então, os períodos estabelecidos por lei são ótimos, considerando apenas a questão da violência?

(...) E a sensação da maioria da população, talvez os mesmos que clamam por redução da maioridade penal, é que há muitos adolescentes assassinos entre nós. É como se aquele que matou Victor Hugo Deppman na noite de 9 de abril fosse legião. (...)
Conclusão irrelevante: como a autora sabe a sensação da maioria? (Straw man) Ninguém precisa concluir o todo pela parte para exigir alterações na lei.  Vamos mais uma vez supor uma situação limite. Imagine uma colônia em marte, com sei lá 100 mil pessoas vivendo harmoniosamente. A colônia não possui lei que trate homicídios, porque esses simplesmente nunca aconteceram em Marte. Até que um dia, um cidadão "surta" e começa a "passar" seus vizinhos, ao bel prazer. A comunidade marciana escandalizada pelos fatos, indignada pela ação desse indivíduo exige mudança no código penal. Então uma versão da Eliane Brum marciana, escreve um artigo mostrando como a comunidade foi sempre pacífica, e que apenas um único indivíduo não seria justificativa para "macular" o código penal. Justamente o contrário, tratar peculiaridades torna o código mais preciso e portanto mais justo.    

Bom, podemos tentar entender onde a jornalista quer chegar. Não quero incorrer no mesmo erro, de conclusão irrelevante. Quero ser leniente ao que a autora escreveu.  A argumentação dela parece ser que aumentando o rigor da lei por uma minoria,  poderíamos estar colocando todos os adolescentes sujeitos a penas mais duras. Bom, que fique claro que a proposta do governador de São Paulo, mencionado no texto de Eliane, não generaliza penas mais extensas, mas pede ampliação do tempo máximo de internação para 8 anos ao adolescente infrator que cometer crime hediondo.

O que se espera é um tratamento  mais adequado para cada pessoa e ato. O adolescente serial killer de 17 anos não pode ser tratado da mesma maneira que o adoslecente de 13 anos envolvido com furtos.

Paro por aqui. Não existe razão para não lutar pela educação, nem para não lutar por melhorias sociais do qual o país carece muito. De fato, o estado deve. Segurança pública não se faz apenas pela força. Mas,  criamos feras e não podemos ser ingênuos e acreditar que feras podem ser domesticadas apenas com amor. A sociedade é ao mesmo tempo o cão e seu criador. Bem cuidado, o cão é o companheiro leal e sempre amigo do criador. "Maltratado", será "imprevisível". Ele poderá até abaixar cabeça na esperança que o sofrimento termine. Mas chegará a hora que ele se voltará contra a mão vil que lhe afaga. Um monte de beijinhos e abraços não impedirá que o cão "traiçoeiro" arranque o pescoço do criador.

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

Pequeno manual do ócio em terras alemãs

  Pequeno manual do ócio em terras alemãs Como Lei alemã favorece aproveitadoras (e alguns aproveitadores que nunca tive o desprazer de conhecer)   Há algumas vias pelas quais pessoas de países em desenvolvimento migram para países como a Alemanha.   Por exemplo, é sabido que países desenvolvidos sofrem de escassez de mão-de-obra qualificada. Por esse motivo, países como a Alemanha dispõe vistos "especiais" para profissionais em demanda. Esse é o conceito do Blaukart (Blue Card) que na Alemanha se destina a profissionais salário anual seja superior a 55 mil euros ou 43 mil no caso de profissionais de áreas em alta demanda. Não há como recrutar essa mão-de-obra sem que a família desses profissionais também possa ser relocada. Então esses profissionais e seus familiares são relocados.   Além de se qualificar para essas vagas em demanda, ou ser parte direta da família qualificada, outra via possível para a imigração para o território alemão é através do matrimôni

The escape of blue eyed vampires (answer)

The island of blue eyed vampires (answer) An initial idea Each one needs to figure out if him/herself is blue eyed. They assume having blue eyes and see how the others react. A technical details There are some variations to formalize this problem using different type of logic: modal logic, temporal logic, Public Announcement Logic and so on. I believe that those kind of prove are tedious to write and read. For now, I will write a sketch to a prove but I belive the best way to prove is using an algorimthm what basically, it would be an adaptation of DPLL algorithm (Davis–Putnam–Logemann–Loveland) that uses dedutive reasoning and prove by contraction. Legend \[\begin{matrix} BlueEyed(X) :X \text{ is blue eyed.} \\ Leave(X) :X \text{ leaves.} \\ O(y) :y \text{ holds at the next (temporal) state.} \end{matrix}\] In this temporal simplified logic, we have a set of state that holds the in- formation of days, \(W = \{d_0, d_1, d_2, d3 \ldots , d_n\}\) and transition \(S : W \rightarrow

Answering: top reasons I hate living in Brazil

Yes, some guys shared a teasing topic about “Top reasons why I hate living in Brazil”: http://www.gringoes.com/forum/forum_posts.asp?TID=17615&PN=1&title=top-reasons-i-hate-living-in-brazil What is the point here? The whole text is loaded of cliclés, people that you will hardly find, etc most of time just pissing people off.   I don’t think Brazil is the best country in the world. Also, I don’t think Brazilians don’t make mistakes. Actually we do all the time but most of us really care about our mistakes specially those were pointed out. Some feel like an expatriate, alien in own country. Others reflect about how we could improve. Others  simply don’t accept teases from John Does. So, I’m actually truly bothered with people believing in a bunch of false statements (specially Brazilians) or supporting some cynical arguments disguised “sincere” criticisms . Yes, I make mistakes all the time, and as most of Brazilians, I don’t speak English. However, I will